Kindred: laços de sangue | Octavia Butler

Kindred: Laços de Sangue , Octavia Butler, Editora Morro Branco, na nossa cara os horrores da escravidão, lembrando-nos que é preciso recordar para não esquecer. A Dana, a protagonista, viaja no tempo e vive na época da escravidão. Dana não é apenas uma observadora; ela vive os horrores da escravidão. Essa perspectiva em primeira pessoa permite ao leitor sentir a dor, o medo e a luta pela sobrevivência, tornando a história mais visceral e impactante. É impossível não se sentir dilacerado ao acompanhar a personagem. 

Embora o foco da narrativa seja a escravidão americana, é impossível não fazer conexões com os mais de três séculos de escravidão no Brasil. Kindred é essencial para refletirmos sobre nosso passado, pois questões raciais, preconceito e injustiças sociais estão profundamente enraizadas nesse contexto histórico.

A história é contada pela voz de Dana, uma mulher negra, escritora, casada com Kevin, um escritor branco. Após se mudarem para uma nova casa, Dana desmaia e, ao acordar, se vê em um cenário do século XIX. Sua primeira viagem no tempo é marcada pelo salvamento de um menino, Rufus, que mais tarde se revela um elo crucial em sua jornada.

Kindred: complexidade das relações raciais

A leitura de Kindred foi uma experiência transformadora. Com tantos elogios à obra, eu já esperava uma narrativa que desafiasse minhas certezas e confortos. O livro não aborda apenas a escravidão, mas também temas como amor, ódio e misoginia.

O amanhã é uma esperança, nunca uma promessa.

Dana se destaca como uma mulher admirável. Sua força não se limita a suportar a brutalidade da época, mas também inclui a luta interna com os sentimentos que nutre por Rufus e pelas pessoas ao seu redor. Em situações extremas, eu, no lugar dela, teria sido tomada pelo desejo de violência contra Rufus e seu pai, Tom Weylin.

Rufus e Tom são personagens odiosos; Rufus, que poderia ser melhor, parece incapaz de escapar da brutalidade do ambiente em que cresceu. O livro explora como o contexto social molda as ações das pessoas. Dana e Kevin, mesmo sendo do século XX, não estão imunes à influência desse passado.

A única morte de verdade é nunca viver.

Rufus, filho de um dono de escravos, representa a complexidade das relações de poder e opressão. A relação de Dana com Rufus desafia simplificações sobre o racismo e a opressão. Essa complexidade força o leitor a refletir sobre as nuances das interações humanas em contextos de poder e submissão.

Os personagens secundários, como Alice, Carrie, Niguel, Luke e Sarah, são igualmente impactantes. Queria protegê-los e dizer que um dia as coisas melhorariam, mas seria uma mentira, pois a luta ainda persiste. Mas mesmo em meio a tantas dificuldades, a narrativa revela a presença de amor e amizade, mostrando que sentimentos profundos podem surgir em meio à adversidade.

Concluindo, leiam Kindred. A escrita de Octavia Butler flui de maneira envolvente. Apesar do peso dos temas e das passagens brutais, sua maestria com as palavras torna essa leitura indispensável.